Odontologia e afecções orais em roedores e lagomorfos
A ordem Rodentia é extraordinária, sendo a maior entre os mamíferos, compreendendo desde um pequeno rato com poucos gramas de peso até uma capivara com aproximadamente 50 quilos. A ordem Lagomorpha conta com um número menor de representantes, sendo os coelhos e lebres os mais conhecidos. A diferença básica entre estas ordens, se tratando de odontologia, está na presença dois pares de incisivos superiores nos lagomorfos, sendo um deles incisivos rudimentares imediatamente caudais aos incisivos principais.
Se tratando de pets não convencionais, os coelhos e roedores como chinchilas e porquinhos da Índia são animais de estimação cada vez mais populares, e as espécies que mais apresentam problemas odontológicos na rotina clínica.
Estes pequenos mamíferos têm como característica peculiar possuir dentes de crescimento contínuo (elodontes). São animais essencialmente herbívoros, se alimentando na natureza de grandes quantidades de folhagens fibrosas, o que leva ao atrito e conseqüente desgaste dos dentes. Assim, a evolução proporcionou-lhes dentes que crescem de forma contínua, que compensa o desgaste sofrido durante a alimentação.
Nos ratos, hamsters e esquilos, apenas os incisivos crescem continuamente. Estes pequenos roedores têm dietas mais variadas e concentradas em energia (frutos frescos e secos e, ocasionalmente, alimentos de origem animal). Os dentes molares destas espécies são semelhantes aos dos seres humanos, e não crescem ao longo de toda a vida.
Portanto, em coelhos, porquinhos da Índia e chinchilas deve haver um equilíbrio entre o crescimento e o desgaste. Caso ocorra um desequilíbrio, ou seja, qualquer fator que prejudique o desgaste adequado dos dentes, potenciais patologias bucais podem surgir, o que influencia diretamente a saúde geral.
A causa mais frequente de excessivo crescimento dentário em coelhos e roedores tem origem em uma alimentação inadequada. Apesar do mercado dos animais de companhia dispor de inúmeros produtos rotulados para estes herbívoros, muitas vezes os alimentos não possuem uma constituição adequada.
Por falta de informação especializada, muitos destes animais recebem apenas alimentos inadequados, de elevada concentração energética, o que predispõe a obesidade, ou ainda alimentos com baixo valor nutricional, o que debilita o sistema imunológico e pode acarretar em doenças.
Com uma dieta constituída basicamente por ração, sementes, cereais e afins, os alimentos são mastigados de uma forma em que não há o movimento adequado para o contato dos dentes e correto desgaste, levando ao desenvolvimento de dentes pontiagudos, que machucam as bochechas e a língua dos bichos.
Este processo é bastante doloroso, e os animais começam a comer menos e a selecionar alimentos de textura mais macia. Os dentes continuam a crescer, e podem perfurar a mandíbula e a maxila, originar abscessos e possíveis infecções sistêmicas decorrentes de um problema que poderia ser evitado.
Coelhos, roedores e demais espécies silvestres têm uma grande capacidade para disfarçar que estão doentes, e muitos casos acabam por serem diagnosticados tardiamente. São processos geralmente acompanhados duma grande variedade de sintomas e sinais clínicos, alguns apenas evidentes em uma fase muito avançada da patologia.
Entre os sintomas mais frequentes, podemos observar perda de peso progressiva, diminuição e seletividade na ingestão de alimentos; alteração no tamanho, volume e aspeto das fezes, pelagem em mau estado, salivação excessiva, corrimento ocular e/ou nasal, presença de inchaços ou assimetria na face.
Sempre que for observado qualquer dos sinais citados em seu coelho ou roedor, deverá levá-lo ao médico veterinário especializado para que seja examinado. Além do exame clínico, geralmente é necessário proceder a radiografia do crânio do animal. O raio X é indispensável para avaliar a extensão do processo.
Se confirmado o excessivo crescimento dentário e patologias adjacentes, o comprimento dos dentes deverá ser corrigido, e abcessos caso existentes, devem ser removidos. Estes procedimentos são sempre feitos por um médico veterinário, com o paciente sob anestesia geral. Nunca tente cortar os dentes do seu animal de estimação em casa, com um alicate ou um cortador de unhas! Estes métodos são totalmente inadequados e podem levar a complicações graves.
Assim como em diversas outras patologias, o ideal é sempre a prevenção. Devemos sempre oferecer aos nossos coelhos e roedores herbívoros de estimação uma dieta fibrosa, adequada para o desgate dos dentes, contendo feno e verduras, de preferência de folha verde escuro.